Violência Sexual Infantil é um tema pesado. É difícil de lidar para profissionais que trabalham o assunto e nem há adjetivo que meça o que passam os envolvidos: família e criança.
Alguns dos motivos que o tema é tão complicado para os profissionais na nossa infra-estrutura e ambiente são:
- Como diferenciar uma carícia normal entre pais e filhos da sexualidade abusiva;
- Como acreditar que um membro da família abuse de uma criança;
- Como desvendar os segredos familiares que envolvem o abuso;
- Como trabalhar junto às estratégias da qual o agressor lança mão para manter a vítima calada;
- Como perceber no comportamento da criança aquilo que revela as conseqüências do abuso.
- Como não piorar uma situação sendo que ela já é tão delicada?
Mas não é possível ficar calado ou negligenciar tamanho ato covarde. E cultura, informação e ações são imprescindíveis para lidar e saber como se portar diante de uma situação inesperada.
Adultos responsáveis, pais precisam entender e estar atentos a sinais e também a revelações da crianças não ignorando e negligenciando e também não incentivando, mesmo sem querer, a ação.
Ensine seu filho ou sua filha a ficar atendo mas não dê nomes: não fale: se o vovô fizer mal ou “se o papai tocar em você”. Explique que se um adulto fizer isso e que se ela se sentir incomodada deve contar imediatamente para outro adulto.
Você deve prestar atenção aos momentos da relação que acontecem quando a criança/adolescente relata o abuso sofrido.
Normalmente são momentos especiais e inesperados, onde precisamos estar preparados para ajudar. A revelação pode ocorrer em situações como: a criança relatar uma frase desconexa sobre sexo na rodinha da creche (“…o pipi do meu pai é grande e machuca…”), ou relatar sua vitimização para alguém que confia.
Mitos sobre a Violência Sexual Infantil
A Violência Sexual Infantil é rara.
Pesquisas indicam que em cada 1 em 3 a 4 meninas e 1 em 6 a 10 meninos serão vítimas de abuso sexual até os 18 anos. Em 2015, o disque 100, o disque direitos humanos registrou um aumento de 6,8% dos casos no Brasil. Somente 1 em cada 10 casos de abuso é relatado. [1]
Não é possível que haja abuso sexual com crianças pequenas.
Mais de 1/3 das denúncias envolvem crianças de 5 anos ou menos, inclusive bebês.
Todo abusador é pedófilo [4]
Nem todo pedófilo é abusador. E nem todo abusador sexual é um pedófilo.
Pedófilo: Para a Psiquiatria, o pedófilo é um indivíduo que apresenta um transtorno sexual caracterizado por fantasias sexuais excessivas e repetitivas envolvendo crianças. Tem, portanto, uma parafilia – definida, de acordo com o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-IV), como a recorrência de impulsos sexuais muito intensos e por fantasias e comportamentos não-convencionais de caráter compulsivo. “A motivação que está por trás da busca pelos corpos infantis é o desejo sexual que o pedófilo nutre pela criança per se e o prazer obtido por meio dela. Dificilmente um pedófilo sente atração sexual por uma pessoa adulta”, escrevem os pesquisadores Renata e Bernardo no artigo.
Segundo o psiquiatra francês Patrice Dunaigre, especialista em pedofilia citado no texto, os pedófilos provavelmente não tiveram um desenvolvimento psicossexual satisfatório. Revelam uma sexualidade imatura e pouco elaborada, o que os leva a temer a aproximação com parceiros adultos, já que esses podem resistir às suas investidas afetivo-sexuais. Por serem sexualmente inibidos, escolhem como parceiros as crianças (são mais vulneráveis e com menor capacidade de resistência), com as quais se identificam.
O pedófilo não consegue estabelecer um controle racional ou objetivo diante de sua demanda erótica. Por isso, pode se tornar um abusador. E, se evita o contato com uma criança ou um adolescente, é provável que busque imagens de pessoas naquela faixa etária ou textos que correspondam a suas fantasias para se satisfazer.
Abusador: Longe do estereótipo de “monstro”, atribuído muitas vezes pela mídia, o abusador geralmente não apresenta comportamento condenável social ou legalmente. Pode pertencer a qualquer classe social e, na maioria dos casos, está próximo da criança e conta com a confiança dela. Aproveita-se da relação assimétrica de poder que mantém com a vítima.
“O abuso do poder para fins de gratificação e satisfação sexual pode acontecer através de mecanismos de chantagem, ameaça ou violência explícita, mas pode configurar-se também por meio de um jogo emocional onde os desejos e conflitos não são explícitos e a vítima torna-se refém da trama de seus sentimentos”
afirma a psicóloga Maria Aparecida Martins Abreu em sua dissertação de mestrado Trágica Trama: o abuso sexual infantil representado no filme Má Educação (2005).
Conforme a publicação Reconstrução de Vidas (2008), do Centro de Referência às Vítimas de Violência, do Instituto Sedes Sapientiae, o agressor sabe que seus atos abusivos são errados, ilegais e prejudicais à criança, mas mesmo assim os mantém.
“O abuso não provoca uma experiência primária de prazer, e sim alívio de tensão. A excitação e a gratificação sexual levam à dependência psicológica e à negação dessa realidade”, diz o texto.
Ainda de acordo com a obra, nas famílias onde ocorrem práticas abusivas, há com frequência a presença de condições que favorecem esse tipo de interação, como fronteiras frágeis entre as gerações; estrutura familiar simbiótica, rígida ou caótica e vínculos disfuncionais que superprotegem ou excluem um ou outro de seus membros.
Basta ensinarmos nossas crianças a evitarem estranhos perigosos, para que não sejam abusadas sexualmente.
85-90% dos agressores são conhecidos da criança, principalmente de sua própria família.
Os agressores são homens idosos, violentos, alcoolistas, desempregados, sexualmente depravados, homossexuais e/ou com transtornos psiquiátricos.
Geralmente os agressores parecem normais, sob vários aspectos. Ninguém tem uma seta indicadora de violentador. Os crimes sexuais têm sido cometidos em todos os níveis socioeconômicos e em todos os grupos raciais, religiosos e étnicos. Crianças são vitimizadas no campo e na cidade. A maioria dos agressores sexuais são homens heterossexuais e têm acesso à relações sexuais com adultos.
O que também não generalizada – A psicóloga do hospital Pérola Byington Daniela Pedroso, especialista em violência sexual contra crianças e adolescentes, por exemplo, estima que o número de casos em que uma mulher é a agressora deve ficar em torno de 5% do total. “Fica mais oculto. A denúncia de casos de abuso sexual de forma geral já acontece apenas entre 10% e 20% das vezes que acontece. No caso das mulheres, então, muito menos”. Uma das poucas estatísticas disponíveis é a da percentagem de mulheres encarceradas por delitos sexuais nos EUA – do total de presos naquele país por crimes dessa natureza, as mulheres chegam a 3%. [5]
Se a criança consente e não diz NÂO, é porque gostou, então não é abuso sexual
Vitimização sexual NUNCA é culpa ou responsabilidade da criança. O agressor sexual tem inteira responsabilidade pelo crime, qualquer que seja a forma por ele assumida. Muitos abusos se dão sem o uso de força física.
Por exemplo:
Partindo de análise de imagens encontradas na Internet, Reis e Reifschneider [3] classificam a pornografia envolvendo crianças e adolescentes em três tipos distintos:
pornografia infantil bizarra – consiste em imagens de crianças pequenas e até bebês sendo abusados sexualmente por adultos. Esse tipo de material é denominado de CP sick (child pornography sick) pelos próprios pedófilos;
pornografia infantil focalizada em crianças maiores, mas ainda impúberes, ou no início da adolescência. Essas crianças são geralmente fotografadas e filmadas nuas ou em trajes íntimos e, por sua expressão facial, é possível perceber que não têm consciência do que está se passando. Esse material é também voltado a pedófilos;
pornografia juvenil, muitas vezes associada à pornografia adulta. Esse tipo de pornografia retrata adolescentes, principalmente do sexo feminino, já com as características sexuais secundárias desenvolvidas, ou seja, “meninas com corpo de mulher”. [2]
O abuso sexual é sempre o estupro cometido de forma violenta
A vitimização sexual pode incluir telefonemas obscenos, exposição de genitais e/ou de materiais pornográficos, prática de atos libidinosos (incluindo masturbação), relações (ou tentativas) sexuais orais, anais, vaginais e exploração da criança através de prostituição e/ou produção de pornografia. Ou seja, COM ou SEM contato físico.
Os agressores param quando são presos ou quando prometem parar
Os agressores quase nunca procuram tratamento para parar do abuso voluntariamente, eles podem parar de vitimizar uma dada criança, mas logo podem fazer o mesmo com outra. A vitimização quase sempre continua de um modo ou de outro, ao menos que o agressor esteja em tratamento em alguma instituição especializada.
A criança esquece o abuso sexual sofrido, desde que os adultos não a relembrem
Crianças não costumam esquecer. Elas podem tentar ocultar seu sofrimento, sua confusão e seu ódio porque acreditam que os adultos não querem ouvir falar disso. Elas podem interpretar o silêncio do adulto como censura ou raiva. É muito importante que a vítima, o agressor e o pai (mãe) não agressor, recebam tratamento terapêutico especializado.
Somente as crianças ameaçadas não revelam o segredo do abuso sexual
Crianças podem não falar por medo da violência contra sí ou contra alguém que ama. Elas também não contam quando temem censura, temem acarretar ruptura na família e quando temem não serem acreditadas.
A maioria dos casos é denunciada
Para cada caso denunciado, estima-se que existam 10 a 20 casos que não são, seja por medo, por motivos afetivos, por ninguém acreditar na criança, etc
Se o abusador é da família, é um parente distante
Para cada caso denunciado, estima-se que existam 20 casos que não são, seja por medo, por motivos afetivos, por ninguém acreditar na criança, etc.
As crianças que vendem seu corpo já nasceram com má índole
As crianças vítimas de exploração sexual na maioria das vezes foram inicialmente vítimas sexuais dentro de sua família.
Fique atento aos sinais e procure ajuda especializada, disque 100.
Indicadores físicos em criança/adolescente
Indicador quer dizer que é um alerta. Não que acontece ou está acontecendo. Perceba essas alterações físicas e investigue a origem.
- Dificuldades de caminhar;
- Infecções urinárias;
- Secreções vaginais ou peniana;
- Baixo controle dos esfincteres (cú) ou segurar o cocô;
- Presença de Doenças Sexualmente Transmissíveis;
- Enfermidades psicossomáticas (peça ajuda de um psicólogo);
- Roupas rasgadas ou com manchas de sangue;
- Dor ou coceira na área genital ou na garganta (amigdalite gonocócica);
- Dificuldade para urinar (fazer xixi) ou deglutir (engolir e mastigar);
- Edema e sangramento da genitália externa, regiões vaginal ou anal;
- Começo da vagina alargada;
- Sêmen (porra) ao redor da boca, dos genitais ou na roupa;
- Odor vaginal ou corrimento.
Indicador Comportamental da Criança e do Adolescente
- Vergonha excessiva;
- Autoflagelação (machucar-se propositadamente, cortando-se, etc);
- Comportamento sexual inadequado para sua idade;
- Regressão a estados de desenvolvimento anterior (adolescente se portar como criança);
- Tendências suicidas;
- Fugas constantes de casa;
- Mostra interesse não usual por assuntos sexuais e usa terminologia inapropriada para a idade;
- Masturba-se excessivamente;
- Desenha órgãos genitais além de sua capacidade etária;
- Alteração de humor – retraída x extrovertida;
- Resiste a participar de atividade física;
- Relata avanços sexuais de adultos;
- Resiste a se desvestir ou a ser desvestida;
- Resiste a voltar para casa após a aula;
- Mostra medo de lugares fechados;
- Tenta mostrar-se “boazinha”;
- Ausência escolar, por motivos insubsistentes;
- Conduta muita sexualizada.
Indicadores de características familiares
- Muito possessiva com a criança, negando-lhe contatos sociais normais;
- Acusa a criança de promiscuidade ou sedução sexual;
- O agressor pode ter sofrido esse abuso na sua infância;
- Acredita que a criança tenha atividade sexual fora de casa;
- Crê que o contato sexual é uma forma de amor familiar;
- Paradoxalmente dominador e fraco;
- Pode abusar de álcool ou drogas;
- Sugere ou indica discórdia conjugal ou dificuldades de se relacionar com adultos;
- Indica isolamento social ou a condição de família monoparental;
- Mostra conduta impulsiva e imatura;
- Tende a culpar os outros por dificuldades da vida;
- Tenta minimizar a seriedade da situação;
- Estimula a criança a se desenvolver em condutas ou atos sexuais.
Atitudes que podem ajudar a criança vitimizada
- Acreditar nela;
- Não culpá-la jamais;
- Mostrar que ela não está só;
- Deixar que fale sobre seus sentimentos;
- Incentivar a participação na terapia (desmistificar a falsa ideia de psicólogo e loucura);
- Não criar expectativas que não se sabe se poderão ser cumpridas;
- Reforçar atitudes positivas da criança;
- Incentivar a auto-confiança;
- Dizer o quanto é importante, valiosa e adequada;
- Dizer e permitir que seja diferente, respeitando seu jeito de ser;
- Explicar que outras crianças ou adolescentes também passaram pelos mesmos percalços;
- Explicar a diferença entre sexualidade e o abuso;
- Permitir à criança desabafar e reconhecer seus sentimentos frente ao agressor;
- Permitir que a criança, ciente de seus direitos, possa participar do processo decisório alusivo à sua segurança (esta especialmente para profissionais da área da violência);
- Ensinar a criança estratégias de defesa em situações similares, telefones e locais que podem lhe oferecer proteção;
- Valorizar e fortalecer os vínculos sociais e/ou familiares positivos/protetivos;
- Deixar que a criança possa falar e/ou fazer perguntas sobre a violência sofrida.
Como Denunciar
Disque-Denúncia: 0800 643-1407 SOS Criança
Disque 100 – Direitos Humanos
Em nenhum há a necessidade de se identificar. Você pode fazer anonimamente.
Referências utilizadas neste post sobre Violência Sexual Infantil
[1] http://www.childhood.org.br
[2] LANDINI, T.S. Envolvimento e distanciamento na produção brasileira de conhecimento sobre pornografia infantil na Internet. São Paulo em Perspectiva, São Paulo, Fundação Seade, v. 21, n. 2, p. 80-88, jul./dez. 2007. Disponível em: ;
[3] REIS, A.V. dos; REIFSCHNEIDER, E.D.B. Pesquisa sobre pornografia infantil na Internet. Brasília, DF: Secretaria Especial de Direitos Humanos, 2004.
[4] http://www.childhood.org.br/nem-todo-pedofilo-e-um-abusador-sexual-2
[5] http://delas.ig.com.br/comportamento/mulheres-que-cometem-abuso-sexual/n1237814945574.html
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