Em um mundo dominado por estímulos rápidos e gratificações imediatas, a arte da disciplina tornou-se um recurso valioso.
Diariamente, somos inundados por histórias de sucesso instantâneo, vitórias da noite para o dia e realização de sonhos em tempo recorde.
Nesse cenário, é fácil nos sentirmos pressionados a atingir a perfeição e pensarmos que tudo é rápido, líquido, fluido…
No entanto, a disciplina, em sua essência, não está na perfeição, mas na continuidade, na persistência e no treino da aquisição de habilidades.
A palavra “disciplina” é amplamente utilizada para se referir à prática de treinar pessoas para obedecer a regras ou um código de comportamento, utilizando, se necessário e na maioria das vezes, punição para corrigir a desobediência. “A disciplina militar”…. “Você precisa ser uma pessoa disciplinada, senão…”
Mas isso não é regra, nem sempre, só é cômodo num mundo violento… Mas isso fica para outro texto… Já em contextos educacionais, “disciplina” pode denotar um ramo específico de conhecimento ou o controle que os professores exercem sobre seus alunos. Lembra? Disciplina de português, matemática, química ou física que são “blocos” focais de conhecimento e estudo.
Além disso, o termo também pode significar autocontrole, evidenciando a capacidade de um indivíduo em gerir e controlar seu próprio comportamento e ações. Fulana ou Beltrano é disciplinado(a).
A origem desta palavra remonta ao latim “disciplina”, que significa “ensino” ou “instrução”, estando intrinsecamente ligado ao verbo “discere”, que se traduz como “aprender”. Disciplina/ae, “ação de se instruir, educação, ciência, disciplina, ordem, sistema, princípios de moral”, cog[nato] de discipulus». Significa, como diacronísmo antigo, «ensino e educação que um discípulo recebia do mestre» ou «obediência às regras e aos superiores»
Originalmente, estava associado ao processo de adquirir conhecimento ou habilidades por meio da instrução ou da educação.
Ao longo dos anos, o significado da palavra evoluiu, abrangendo também noções de treinamento, ordem e controle.
Mas o que isso tem com a psicologia e o tema? Conhecer o significado alinha o sentido que damos as coisas e o entendimento de como podemos incluir tais habilidades no nosso dia-a-dia.
A Ilusão da Perfeição
A perfeição é, em muitos aspectos, uma miragem. Ela é sedutora, mas muitas vezes inatingível e, ao mesmo tempo, pode ser uma prisão.
Aguardar o momento perfeito, o cenário ideal ou a oportunidade dourada pode ser paralisante. O medo de falhar, de não ser bom ou boa o suficiente ou de ser julgado(a) pode nos impedir de dar o primeiro passo. No entanto, a busca pela perfeição pode ser um ciclo infinito e cansativo.
Cada vez que pensamos que chegamos lá, a linha de chegada se move um pouco mais. Em contrapartida, quando aceitamos que a perfeição é inatingível e nos concentramos em fazer o nosso melhor de forma contínua, somos capazes de crescer, evoluir e, eventualmente, alcançar nossos objetivos – mas sem a pressão do “ser perfeito(a).
A pergunta que pode ser feita é: perfeição como? O que é ela? O que afinal tem disciplina com perfeição?
O Poder da Continuidade
Continuar tentando, mesmo diante de adversidades, é onde reside a verdadeira disciplina. Cada passo que damos, mesmo que pequeno, é uma vitória.
Quando nos comprometemos com a continuidade, reforçamos hábitos, construímos resistência e, o mais importante, nos aproximamos de nossos objetivos.
Grandes inovações, descobertas e sucessos na história não foram só o resultado de um momento de genialidade, mas de um comprometimento contínuo com uma visão ou objetivo.
A lâmpada elétrica (a história conta que foram mais de 1.000 tentativas, porém, para Thomas Edison, não eram falhas, eram descobertas de fazer uma lâmpada de mil maneiras diferentes), a penicilina, a teoria da relatividade – todas essas descobertas revolucionárias foram o resultado de tentativa e erro, persistência e, acima de tudo, disciplina e frequência, persistindo e rearranjando em contra-tempos.
Burrhus Frederic Skinner, por exemplo, mais conhecido como B.F. Skinner, foi um dos mais notáveis psicólogos do século XX. Nascido em 1904, ele foi o principal proponente da psicologia comportamental, um campo que busca entender o comportamento por meio do estudo sistemático de relações causa-efeito, sem se apoiar no estudo introspectivo das emoções ou pensamentos.
Nos anos 1930, Skinner começou a desenvolver uma série de invenções para estudar comportamentos.
Uma das mais notórias foi a “caixa de Skinner”, um dispositivo que permitia observar e registrar o comportamento de animais em condições controladas. Porém, a criação dessa caixa não foi simples. Skinner teve que projetar, testar e refinar sua invenção várias vezes para obter dados confiáveis. A sua busca pela precisão e consistência foi comparável à determinação de Thomas Edison ao desenvolver a lâmpada elétrica.
Além da caixa, Skinner se dedicou a estudos que buscavam entender como comportamentos são aprendidos e reforçados.
Ele enfrentou ceticismo e oposição de outros psicólogos e acadêmicos, principalmente daqueles que se opunham a abordagens tão “mecanicistas” do comportamento humano. Mesmo assim, com disciplina e dedicação, Skinner continuou seus experimentos, publicando numerosos artigos e livros que fundamentaram a análise experimental do comportamento.
O legado de B.F. Skinner é imenso. Seu compromisso com a precisão, rigor metodológico e, acima de tudo, disciplina, transformou a forma como muitos psicólogos abordam o estudo do comportamento. Hoje, sua obra é facilmente acessível, e muitos detalhes sobre sua vida e contribuições podem ser encontrados em fontes como o site da Association for Behavior Analysis International e em biografias publicadas sobre o psicólogo.
Disciplina na Psicologia
A disciplina desempenha um papel fundamental na psicologia. Ela pode ajudar a moldar comportamentos, estabelecer rotinas e promover bem-estar mental, emocional ou psíquico como queira chamar.
Quando somos disciplinados em nossas ações e pensamentos, somos mais propensos a ter uma visão positiva de nós mesmos, a enfrentar adversidades de maneira resiliente e a cultivar relacionamentos saudáveis.
A continuidade, como um aspecto central da disciplina, nos permite construir hábitos saudáveis, estabelecer rotinas e superar desafios.
Ela se torna a fundação sobre a qual podemos construir uma vida plena e significativa.
Ao longo da história da psicologia, o conceito tem sido examinado e redefinido de diversas maneiras. Nos primórdios, filósofos como Platão e Aristóteles exploraram a natureza da mente humana e a disciplina era entendida como um autocontrole moral e ético.
Estes pensadores acreditavam que o autocontrole e a autorreflexão eram fundamentais para alcançar uma vida plena e virtuosa. Esta abordagem filosófica forneceu as bases iniciais para o entendimento subsequente da disciplina na psicologia.
No final do século XIX e início do século XX, com o advento do behaviorismo, a disciplina começou a ser entendida de uma perspectiva mais mecanicista.
John B. Watson e B.F. Skinner, principais proponentes do behaviorismo, viam a disciplina mais como um resultado de condicionamento e reforço do que como uma manifestação de vontade ou caráter individual. Para eles, comportamentos disciplinados poderiam ser aprendidos e reforçados através de recompensas e punições, dando pouco ou nenhum crédito à introspecção ou à autodeterminação.
Na década de 1960, com o surgimento da psicologia humanista, a percepção da disciplina começou a mudar novamente.
Pioneiros como Carl Rogers e Abraham Maslow defendiam que a disciplina não era apenas o produto de condicionamento externo, mas também uma expressão da busca intrínseca do indivíduo por crescimento e autorrealização.
Esta perspectiva coloca a ênfase no potencial humano e na capacidade de cada indivíduo de exercer autodisciplina como parte de sua jornada para alcançar seu máximo potencial.
Nos tempos modernos, a psicologia cognitivo-comportamental aborda a disciplina como resultado da interação entre pensamentos, sentimentos e comportamentos.
Técnicas e estratégias são desenvolvidas para ajudar os indivíduos a cultivar a autodisciplina, reconhecendo padrões de pensamento prejudiciais e substituindo-os por pensamentos mais produtivos.
Independentemente da abordagem, a disciplina permanece um tópico central na psicologia, refletindo a contínua busca da humanidade por compreender e aprimorar a própria mente.
À medida que a neurociência avança e a tecnologia se torna mais sofisticada, a compreensão da disciplina se aprofunda ainda mais.
Por exemplo, estudos de neuroimagem têm lançado luz sobre as áreas do cérebro responsáveis pela autoregulação e controle de impulsos, oferecendo uma perspectiva biológica sobre como a disciplina é manifestada e pode ser fortalecida.
Além disso, o mundo globalizado e digitalizado do século XXI trouxe novos desafios e contextos para a aplicação da disciplina.
As constantes distrações digitais e a sobrecarga de informações exigem níveis ainda mais elevados de autodisciplina para manter o foco e a produtividade.
Isso levou a um interesse renovado em técnicas tradicionais, como meditação e mindfulness, bem como a novas abordagens e ferramentas tecnológicas para auxiliar no desenvolvimento da autodisciplina.
Enfim, enquanto o conceito de disciplina continua evoluindo com o tempo, sua relevância e importância para a compreensão e melhoria da condição humana permanecem constantes. E acredito que já falei bastante sobre o assunto. Agora vamos às dicas?
5 Dicas para Adquirir Disciplina
Estabeleça Metas Claras
Ter uma direção clara e um propósito bem definido é fundamental para desenvolver a disciplina.
Antes de se embarcar em qualquer jornada, é crucial saber para onde você está indo e por que está se esforçando naquela direção.
Ser específico sobre o que você deseja alcançar não apenas mantém o foco, mas também proporciona motivação ao longo do caminho.
Definir metas realistas e tangíveis para si mesmo é uma parte vital desse processo. Um método popular para definir metas claras é o método SMART, que significa Específico, Mensurável, Atingível, Relevante e Temporal.
Por exemplo, em vez de dizer “Quero perder peso”, uma meta SMART seria “Quero perder 5 quilos nos próximos dois meses através de dieta e exercício”.
Outro método é o método “3 Por quês”.
Quando você estabelece uma meta, pergunte-se “por quê?” três vezes consecutivas.
Por exemplo, “Quero aprender uma nova língua”. Por quê? “Para comunicar-me em viagens internacionais”. Por quê? “Para me imergir mais profundamente em outras culturas”. Por quê? “Para enriquecer minha compreensão pessoal e profissional do mundo”.
Ao delinear claramente o motivo por trás de sua meta, você pode encontrar uma motivação mais profunda e duradoura para manter a disciplina e alcançar seus objetivos.
Crie Hábitos Diários
Pequenas ações consistentes levam a grandes resultados. Em vez de se concentrar em grandes tarefas, divida-as em etapas menores e incorpore-as à sua rotina diária.
Evite Procrastinação:
A procrastinação é frequentemente descrita como o assassino silencioso da produtividade e é, sem dúvida, o inimigo da disciplina. Adiar tarefas, especialmente aquelas que são desafiadoras ou menos agradáveis, é uma armadilha comum em que muitos caem, mas que pode ser superada com estratégias deliberadas.
Uma técnica eficaz para combater a procrastinação é a “Regra dos Dois Minutos”.
A ideia é que se algo leva menos de dois minutos para ser concluído, deve ser feito imediatamente.
Isso pode ser tão simples quanto responder a um e-mail rápido, organizar sua mesa ou fazer uma tarefa breve. A realização dessas pequenas tarefas pode criar um efeito dominó, incentivando você a abordar tarefas maiores com mais entusiasmo e menos resistência.
Outra estratégia útil é o “Compromisso Público”.
Quando compartilhamos nossas intenções ou metas com outras pessoas, seja em redes sociais, com amigos, familiares ou colegas de trabalho, estamos mais inclinados a seguir adiante devido à pressão social e ao desejo de não decepcionar os outros ou a nós mesmos.
A responsabilidade que sentimos quando outros estão cientes de nossos objetivos pode ser um forte motivador para evitar a procrastinação.
Além desses métodos, a técnica Pomodoro, também é uma ferramenta poderosa, pois divide o trabalho em blocos de tempo focados, seguidos de curtos intervalos de descanso.
Começar o dia com a tarefa mais desafiadora, muitas vezes referida como “engolir o sapo”, também pode criar um senso de realização que impulsiona a produtividade ao longo do dia. Se você está procurando mais insights e técnicas para combater a procrastinação, recomendo ler “este artigo“.
Celebre Pequenas Vitórias
Cada passo que você dá em direção ao seu objetivo é uma vitória. Celebrar esses momentos pode servir como motivação e reforçar seu compromisso com a disciplina.
Mantenha a Consistência:
Mesmo quando as coisas ficam difíceis, é crucial manter-se firme. A disciplina é como um músculo que precisa ser trabalhado regularmente para se fortalecer.
Finalmente encerrando… desculpem, o texto ficou até maior que eu tinha imaginado.. 😛
A disciplina é uma jornada, não um destino.
Ela não está em atingir a perfeição em cada tarefa ou ação, mas em manter-se fiel ao curso, independentemente dos obstáculos.
Em um mundo que frequentemente valoriza o brilho do sucesso instantâneo, é crucial lembrar que é a dedicação contínua, a persistência e a disciplina que verdadeiramente moldam nosso caráter e definem nosso caminho na vida. Seja em nossos objetivos pessoais, profissionais ou em nossa saúde mental, a disciplina é a chave para uma vida plena e realizada.
Em cada passo, em cada desafio, lembre-se: não se trata de ser perfeito, mas de ser contínuo. Ler um livro, persistir em uma tarefa, mas sempre ponderando, até onde está a disciplina e a teimosia, mas acho que aí, já. éassunto para outro texto né?
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Referências:
Psicólogo CRP 06/154.661 - Formado Psicologia e em Administração com ênfase em Marketing, geek que respira tecnologia, pesquisador e mestrando em tecnologias da inteligência e design digital. É um dos fundadores do Psico.Online e do MeuPsicoOnline.com.br. Com diversos artigos e livros publicados tem sua atuação focal em jovens, adultos e idosos. Agende comigo
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Raul Oliveirahttps://psico.online/blog/author/mraul/
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