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Viver é perigoso

Chegou uma questão da Caixa de Segredos. Uma questão que muito me chamou a atenção, despertando grande interesse em responder à leitora, pois o potencial para autorrealização e a força que essa pessoa demonstrou quando confiou ao Blog seu sofrimento, é digno de atenção e um exemplo de coragem a ser seguido…

O questionamento relata uma profunda tristeza e incompreensão que se sente na leitura; é de uma tristeza persistente, invasiva, que dói na alma; uma tristeza que não encontra palavras para expressá-la, palavras para fazer as pessoas ao redor compreenderem a profundidade dessa dor; uma condição que traz cansaço, solidão, perda do prazer em atividades que, em outros momentos, traziam contentamento.

Perda do apetite em tocar e ser tocado, se relacionar, onde existe um esforço quase sobre humano para continuar caminhando, lutando contra essa condição absurdamente dolorosa que, em determinados dias, parece se agravar, pois perturba a mente, dificultando a capacidade de raciocinar, de encontrar uma saída para essa dor.

Essa infelicidade ofusca totalmente a visualização de um futuro diferente, e não sugere, em lugar nenhum, uma perspectiva de melhoras.

Essa leitora expôs uma tristeza que anuncia indiferença e a percepção de que ninguém se importa com a dor existente, trazendo a sensação de que sozinha é humanamente impossível continuar caminhando sem se entregar ao abismo de angústias, fazendo concluir que, o melhor que dá pra se fazer é dormir, pois o adormecimento pausará momentaneamente a dor incessante…

Não quero neste post discorrer sobre soluções.

Para a maioria dos dilemas da existência não existem soluções universais, e não tenho a pretensão de saber do sofrimento mais do que a pessoa que o sente.

Entendo que seja pertinente trazer aqui uma passagem de Guimarães Rosa, que assertivamente, retrata em poucas palavras a individualidade de perceber a própria trajetória na vida…

“Viver é muito perigoso… Porque aprender a viver é que é o viver mesmo… Travessia perigosa, mas é a da vida. Sertão que se alteia e abaixa… O mais difícil não é um ser bom e proceder honesto, dificultoso mesmo, é um saber definido o que quer, e ter o poder de ir até o rabo da palavra”

Nessas palavras, Guimarães Rosa nos coloca a refletir que o aprendizado do viver mora nos caminhos tortuosos que percorremos, e só tomamos consciência que eles são tortuosos porque nos causam sofrimento.

A vida é uma teia de conexões e essas conexões são construídas em cima das experiências que adquirimos a todo instante. Nosso estado de espírito está intimamente ligado à percepção que fazemos de sucesso ou insucesso de cada experiência que nos engajamos, e muita coisa está envolvida nisso.

A complexidade de se sentir feliz ou triste envolve inúmeros fatores:

Como anda vida profissional ou escolar?

E a vida sentimental, está sendo preenchida?

Quem a compõe está satisfazendo nossas expectativas?

As condições gerais de saúde, a autoimagem que contenta o entendimento de estética e o círculo social que estou inserido suprem os padrões pré-estabelecidos socialmente? Família, condição espiritual, intelectual, financeira, motivacional estão alinhadas?  

São muitas as perguntas, e quando uma ou várias questões não proporcionam o sentimento de autorrealização, tendemos a ser invadidos pela tristeza, e o que faremos com ela é que determinará se as condições presentes vão nos paralisar ou nos impulsionar para buscar reverter a situação.

Quando Guimarães Rosa sentencia que “viver é muito perigoso”, ele sabiamente reconhece que todo sofrimento é autêntico, e que não existe nenhum problema maior ou menor que outro; que cada pessoa vai, invariavelmente, se deparar com seu “inferno astral” em determinado momento da vida, e que com o passar dos anos tendemos a nos conhecer cada vez mais, tornando-nos peritos em identificar as próprias necessidades e prioridades.

Se sentir incapacitado não é sinal de fraqueza, muito pelo contrário, pois se a pessoa se sente incapacitada pela tristeza, e isso transcende o anonimato e ecoa para outras pessoas, é sinal de que ali há coragem suficiente para reconhecer as inadequações da própria alma, e querer mudar…

Sigmund Freud, pai da Psicanálise, ilustrou:

“Quando a dor do sofrimento for maior que o medo da mudança, a pessoa muda”.

Então, primeiramente, é sugerido que o sofrimento e a tristeza sejam reconhecidos como autênticos; é preciso reconhecer que todas as pessoas se entristecem, em algum momento da vida e por motivos diversos. Que a Depressão, enquanto enfermidade, é uma realidade cada vez mais presente em nossa sociedade, contudo, reconhecer essa condição, se apropriando das causas que levam à tristeza crônica e relutar sempre à entrega são posturas de vida a serem assumidas na trajetória de cada um.

A orientação psicológica, proporcionada por um profissional capacitado, sempre será premissa básica para quem necessita compreender melhor as causas de profundas tristezas, na busca pelas melhores ferramentas para o restabelecimento do equilíbrio mental.

“Viver é perigoso”, e não deixará de sê-lo nunca, pela característica de incontrolabilidade que influenciam a vida, contudo, mesmo perigosa, ela pode ser deliciosamente desfrutada.

E, apesar dos eventuais dissabores do caminhar. Isso é que nos distingue, isso que nos faz únicos e indivisíveis, pois a imprevisibilidade humana é capaz de suportar todas as dores existenciais, e ainda sim sorrir, superar, somar e reinventar a felicidade em meio ao caos do dia-a-dia.

Então, querida/o leitora/o: Entendemos que sua tristeza é autêntica, apesar de não termos ideia do quanto está doendo isso tudo em você.

Sugerimos que você procure um Psicólogo aí na sua região, para uma primeira conversa. O Psicólogo tem plenas condições de lhe acolher, e da mesma maneira que você apresentou sua história para a Caixa de Segredos, ela será de grande interesse para o Psicólogo. Mesmo não sendo fácil, tente confiar esses sentimentos, e se a palavra não sair, mostre seu texto… Ele retrata muito bem seu sofrimento, e não tenho dúvidas que a Psicologia possui as ferramentas necessárias para lhe auxiliar a passar por esse momento complicado em sua vida.

Diga que se sente extremamente triste, e da insistência que essa tristeza possui. Muito provável que você compreenda melhor essa dor quando externar que ela parece grudar em seus ossos, e morar sem autorização dentro de ti. Acredite, vários ‘alguéns’ se importam e você não está completamente sozinha/o.

Quando chegamos nesse ponto, costumamos olhar para o abismo e ver um reflexo triste. Por vezes temos dificuldades em enxergar os aspectos positivos da vida, natural, pois a profunda tristeza provoca ilusões causada pela névoa que turva a visão. Nesses momentos, é necessário tomar muito cuidado com o que se lê na Internet, alguns materiais mais atrapalham do que ajudam. Quando, em lampejos de ânimo, em dias que se sentir mais leve, aproveite para visitar um Psicólogo, talvez mais de um, converse um pouco com eles e tire essas dúvidas, permita-se a ajuda!

E para encerrar, gostaria de lhe propor uma reflexão: Você se referiu à acomodação com a situação desconfortante. Talvez seria de muito bom tom pensarmos em substituir a palavra acomodação por incomodação. O músico e escritor Fernando Anitelli um dia profetizou que

“Não devemos acomodar com o que incomoda”, portanto, olhe bem nos olhos do abismo, estenda a sua mão e, num flash dos dias bons, saia para falar com um Psicólogo. Se faça ser ouvida, lida, com esta resposta e depois, venha nos contar o que aconteceu, ok?

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Psicólogo CRP 06 / 131902 graduado pela Faculdade Anhanguera Educacional da cidade de Campinas/SP, pós graduando em Intervenções Psicossociais no contexto das Políticas Públicas e Docência do Ensino Superior na área da Saúde pela Faculdade Campos Elíseos de São Paulo. Formação acadêmica com ênfase em Plantão Psicológico. Psicólogo Clínico e Agente do Sistema de Saúde Mental da Polícia Militar do Estado de São Paulo desde 2016. Busca constante aprimoramento na Abordagem Centrada na Pessoa, da linha Humanista. Atualmente investiga as relações interpessoais em Mediações de Conflitos.

Gostaríamos de escutar o que você tem a dizer.

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